terça-feira, 26 de abril de 2011

"Não há silêncio que não termine" por Rosely Lira




Não há silêncio que não termine

Recebi o livro de Íngrid Betancurt do meu filho, Rodrigo, com a seguinte dedicatória: “O presente de natal para a melhor mãe do mundo.”. Poderia ser uma história em quadrinhos e, ainda assim, seria o melhor presente. Não era. Tratava-se de um dos mais emocionantes depoimentos sobre superação que já tive a oportunidade de ler.

Engraçado, que eu já havia assistido a algumas entrevistas da própria Íngrid contando um pouco da sua trajetória como prisioneira das FARC (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia) na selva colombiana e a minha admiração por essa mulher corajosa já era visível, pois eu não cansava de contar para os mais próximos sobre a sua postura determinada. Mais engraçado, ainda, é que esse livro chegou exatamente no momento em que eu havia decidido romper com meu silêncio diante de situações impensáveis que eu vivia no meu trabalho, o que culminou com o meu pedido de demissão, após cinco anos de espera por dias melhores.

Ainda no mês de dezembro, também havia decidido me manifestar contra as falcatruas no processo de seleção para o Mestrado de um determinado Instituto da UFBA, situação absurda que deveria ter levado ao conhecimento do Ministério Público e entrado com um Mandado de Segurança para garantir meus direitos. Infelizmente, a minha revolta pelas arbitrariedades não foram maiores do que o asco que acabei sentindo por todo aquele conjunto de professores doutores, que utilizam o poder de forma a garantir a si próprios seguidores escolhidos a dedo, desconsiderando todas as diretrizes de um processo de seleção de uma Instituição Pública, que deveria ter a transparência como princípio maior. Paciência! Espero, em breve, ver aquela máfia ser desfeita e os doutores arbitrários afastados dos seus tronos.

A leitura do livro demorou quatro longos meses, seguindo um ritmo completamente diferente de quando eu me identifico com a história e com os personagens. No caso desse livro, tive que fazer muitas pausas para poder digerir tanta crueldade e tantos absurdos contra a pessoa humana, em pleno século XXI.

Íngrid Betancourt Pulecio é natural de Bogotá e era candidata à presidência da Colômbia, quando foi capturada pelas FARC em 23/02/2002, permanecendo refém até 02/07/2008. O livro é de uma riqueza de detalhes impressionante: as informações vão desde a descrição minuciosa dos cativeiros por onde passou, das humilhações que sofreu, até os seus diálogos interiores repletos de valores e exemplos de uma família e de uma história de vida equilibrada e feliz.

Contar certas coisas é permiti-lhes ficar vivas no espírito dos outros, quando o que afinal nos parece mais conveniente é deixá-las morrer dentro de nós mesmos” (pag. 226). Essa frase soou quase como um soco no estômago, visto que fomos educados a internalizar as nossas angústias e situações humilhantes. Infelizmente, somos um povo que pouco reage aos desmandos e às atrocidades que acontecem à nossa volta. Pergunto-me: será medo ou covardia? Se escondermos do mundo o que nos maltrata, nos protegeremos dos julgamentos e das cobranças... Contar, extravasar, lutar por si e pelos outros é comprar uma briga muitas vezes maior do que podemos suportar. Nos primeiros anos do cativeiro Íngrid B. tentou, a todo custo, manter os seus ideais e a sua integridade. No entanto, foi tão punida e humilhada que, em certos momentos declarou:

Levei tempo para aprender a me calar e isso me custou caro. Diante da injustiça, era penoso para mim me resignar. Então, certas manhãs entendi que era mais sábio não tentar resolver os problemas dos outros.” (pág. 245)

Sentia que corríamos o risco de perder o melhor de nós mesmos, de nos dissolver na mesquinharia e na baixeza. Tudo isso não fazia senão aumentar a minha necessidade de silêncio.” (pág. 246)

Em vários momentos do livro Íngrid B. tenta justificar para si mesma a violência e o fanatismo dos jovens membros das FARC (na sua maioria) face à dura realidade da Colômbia e à falta de expectativa com relação ao futuro. Lá existiam pessoas de todos os tipos: os fanáticos, os cruéis, os invejosos, os traiçoeiros, os condescendentes, os piedosos, os vingativos. Precisava parar de ler para refletir o que o seu depoimento passava e, irremediavelmente, cobrava de mim mesma lucidez e julgava: ora, essa é a realidade em que vivemos! Nas amizades, no ambiente de trabalho, nas Instituições de Ensino Superior, na política, nas famílias, nas polícias, nos hospitais... Portanto, no nosso dia-a-dia há gente que age da mesma forma. Se tivessem essas pessoas com rifles e outras armas nas mãos, nos deixariam num cativeiro ou acorrentados a uma árvore e não perderiam nenhuma oportunidade de nos punir. Qual a diferença? Os membros das FARC estavam isolados do mundo lá na selva colombiana, onde tudo podiam, não tendo outra opção para os seus reféns, além da fuga. Essa outra gama de pessoas de má índole e com sérios problemas de conduta estão espalhadas na nossa sociedade, entre as pessoas de bem, protegidas pelos seus títulos, patentes, altos cargos, estrutura familiar aparentemente “sólida”. Agem sub-repticiamente, sempre disfarçados, colocando mordaças invisíveis na nossa boca, tirando de nós as oportunidades, a esperança, pondo à prova os nossos valores mais sagrados. Bastaria uma guerra civil, dessas que aconteceram na África ou que ainda acontecem em tantos países em pleno século XXI para vermos essa maldade explicitada e vermos irmãos matando os seus semelhantes em busca de poder ou pelo simples prazer de ver o outro subjugado às suas insanidades.

Outra reflexão muito dura e mais um tempo obrigatório para digerir essa informação aconteceu quando li esta frase: “Quando me privaram de minha liberdade, eu ficara privada, sobretudo do direito de dispor do meu tempo. Era um crime irreparável. Seria impossível para mim recuperar os milhões de segundos perdidos para sempre.” (pág. 303). Pensei: quantos milhões de segundos perdemos nas nossas vidas, mesmo sem estarmos em nenhum cativeiro, pela falta de determinação, de coragem, de iniciativas? Quanto tempo perdemos nas nossas vidas seguindo ideologias e metas que sequer fazem parte dos nossos anseios pessoais e só acordamos quando a nossa liberdade é tirada, seja por uma doença, por uma tragédia coletiva ou até mesmo por uma incapacidade momentânea? Não estamos num cativeiro real, feito de grades, tal como Íngrid B., mas, de certa forma, estamos em um cativeiro que nós mesmos construímos.

Nem tudo no livro de Íngrid B. é sofrimento. Dentro das suas frases e relatos existem diversas demonstrações de amor e de como essa “bagagem” emocional pode nos tirar das trevas. O amor dela pelos filhos e pelos pais, especialmente a força que recebe da mãe através de um programa que transmite mensagens dos familiares e amigos para os reféns solidificou mais ainda esse sentimento de que ela estava ali momentaneamente esquecida pelo mundo, mas que ela era uma pessoa muito amada e, se algum dia conseguisse sair, teria para onde voltar e quem recebê-la com muita saudade e carinho. Foi emocionante ler como uma bíblia, uma simples corrente de ouro quebrada, uma carta e uma foto serviam de palácio para uma mulher que esteve sete anos vestida com farrapos, privada das suas necessidades mais simples. Foi admirável ver como ela construiu a ponte entre o inferno em que vivia e a sua vida em família. A cada deslocamento imposto pelos algozes, ela tratava de não esquecer o seu tesouro, protegendo-os em saquinhos plásticos ou atém mesmo sob a roupa. O simples fato de se distanciar desses objetos, tinha o poder mais arrasador do que os castigos que sofria.

Mais uma pausa obrigatória para a reflexão e eu passei a me ver no lugar de Íngrid B.: o que seria o meu tesouro? Certamente, qualquer prova física das pessoas que amo. Também me agarraria às fotos dos meus filhos, a toda e qualquer lembrança dos seus rostos e das suas posturas e vozes, a pelo menos um cartão e uma foto (dentre tantos) que Miguel já me deu, às lembranças das longas horas de conversa com as minhas irmãs, à saudade dos meus sobrinhos, à lembrança carinhosa e indispensável dos meus pais durante toda a minha vida, muitas poesias que já li, as tantas músicas que me tocaram de maneira tão profunda, dos amigos que a vida colocou distante... Essa reflexão foi muito prazerosa por que descobri que teria tantos tesouros a carregar comigo e que esses tesouros também serviriam de ponte para que eu jamais desistisse de lutar pela vida.

Íngrid B. trouxe à tona, também, o companheirismo e a cumplicidade. A amizade sincera pelo amigo Lucho era comovente. Como eram preciosos os momentos de silêncio e cumplicidade diante do mesmo sofrimento, a ponto de reservar-lhe comida para que ele não entrasse em um quadro grave provocado pelo diabetes até a desistência da última fuga, quando eles já haviam se distanciado bastante do cativeiro, mas Lucho entrou em crise e as chances dele morrer ou ter graves seqüelas foram maiores do que a necessidade e do anseio pela liberdade.

Não há silêncio que acabe, de Íngrid Betancourt, é um retrato da natureza humana em tudo o que há de mais bonito e de mais podre diante do poder e do medo. Somos nós mesmos colocados frente a frente das nossas fraquezas e dos nossos sonhos. Diante das nossas necessidades mais primitivas. Ela se desnudou e registrou o que aconteceu com ela durante os sete anos de cativeiro, para talvez nos sacudir da mesmice e da hipocrisia que reina na nossa sociedade. Talvez o seu relato seja um alerta para nos mostrar que ela sobreviveu àquela barbárie, mas que as cicatrizes jamais desaparecerão. Por tudo o que lhe aconteceu, ela quebrou o silêncio e falou para os quatro cantos do mundo, mas desistiu da política e dos seus ideais como possível presidente da Colômbia. Um preço bem alto para uma mulher de tantos ideais. E você? De qual silêncio você desejaria se libertar? Do que seria capaz de desistir para não se corromper? Como se comportaria como refém? O que faria se estivesse com uma arma na mão diante de pessoas indefesas? O que faria se tivesse o poder que lhe conferisse mudar o destino das pessoas de acordo apenas com interesses particulares?

Encerro esse encontro com uma poesia de Pablo Neruda, na certeza de que nos encontraremos em breve.

Morre lentamente quem não viaja,

Quem não lê, quem não houve música,

Quem destrói o seu amor próprio,

Quem não se deixa ajudar.

Morre lentamente quem se transforma escravo do hábito

Repetindo todos os dias o mesmo trajeto,

Quem não muda as marcas no supermercado,

Não arrisca vestir uma cor nova,

Não conversa com quem não conhece.

Morre lentamente quem evita uma paixão,

Quem prefere o “preto no branco” e os “pontos nos is”

A um turbilhão de emoções indomáveis,

Justamente as que resgatam brilho nos olhos,

Sorrisos e soluços, coração aos tropeços, sentimentos.

Morre lentamente quem não vira a mesa quando está infeliz no trabalho,

Quem não arrisca o certo pelo incerto atrás de um sonho,

Quem não se permite uma vez na vida,

Fugir dos conselhos sensatos.

Morre lentamente quem passa os dias queixando-se da má sorte ou da chuva incessante,

Desistindo de um projeto antes de iniciá-lo,

Não perguntando sobre um assunto que desconhece

E não respondendo quando lhe indagam o que sabe.

Evitemos a morte em doses suaves, recordando sempre que estar vivo

Exige um esforço muito maior do que o simples ato de respirar.

Estejamos vivos, então!


Rosely Lira é Bacharel em Química pela UFBA e colaboradora do Pergaminho Científico.

quinta-feira, 14 de abril de 2011

Atividade de Campo ao Gabinete Português de Leitura


No dia 28 de março, segunda feira, os estudantes dos Centros Avançados de Ciências do IBIO e do Colégio Estadual Alfredo Magalhães realizaram uma atividade de campo ao Gabinete Português de Leitura, localizado em frente à Praça da Piedade. Acompanhados das professoras Rosemere Lira e Bárbara Rosemar, os estudantes tiveram a oportunidade de aprender mais sobre a história e a arquitetura do Gabinete, que é uma instituição cultural de estudos lusófonos que foi inaugurado no ano de 1863 em Salvador. O objetivo principal do Gabinete Português de Leitura é divulgar a cultura portuguesa na Bahia e em mais dois estados, Rio de Janeiro e São Paulo. No Gabinete é possível consultar obras de consagrados escritores portugueses, como Eça de Queiroz e Luís de Camões. Além disso, os estudantes puderam conhecer a exposição de navios que se encontra atualmente no espaço, com miniaturas de navios franceses, portugueses e ingleses de várias épocas.


TRABALHO DE BOLSISTA IC-JR GANHA PRÊMIO DA FEBRACE


Nos dias 22, 23 e 24 de março aconteceu na USP, em São Paulo, a Feira Brasileira de Ciências e Engenharia (FEBRACE) 2011, onde o Bolsista IC-Jr do Centro Avançado de Ciências do Projeto "Ciência, Arte e Magia" da UFBA Igor Gomes da Costa dos Santos participou com o seu trabalho "Educação Nuclear", acompanhado do seu orientador Jorge Lúcio. Ele apresentou o trabalho em um dos stands oferecidos pela FEBRACE com o poster, jogo eletrônico e fotos do seu experimento, que não pode ser levado por problemas de transporte da maquete. Segundo Igor, o primeiro dia de apresentações era aberto somente para a imprensa e para os avaliadores dos trabalhos, que eram todos profissionais da área de Educação, e os dois últimos dias foram abertos ao público. O projeto de Igor, "Educação Nuclear", busca a criação de novas metodologias para o ensino de física nuclear nas escolas para o ensino médio. Dentre os prêmios oferecidos pela FEBRACE, Igor ganhou dois: o Parceiros da Educação, da empresa Microsoft, que premia trabalhos na área de educação, ganhando um Office da Microsoft. O outro, foi o lugar no prêmio de Melhor Relatório, onde o estudante ganhou uma medalha de bronze e um certificado. O relatório premiado foi enviado à FEBRACE no momento da inscrição, onde é obrigatório que se mande, além do relatório, um resumo e um plano de pesquisa referentes ao trabalho.